segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Afonso, José [Zeca]










No céu cinzento sob o astro mudo
Batendo as asas pela noite calada
Vêm em bandos com pés de veludo
Chupar o sangue fresco da manada

Se alguém se engana com seu ar sisudo
E lhes franqueia as portas à chegada
Eles comem tudo eles comem tudo
Eles comem tudo e não deixam nada [bis]

A toda a parte chegam os vampiros
Poisam nos prédios poisam nas calçadas
Trazem no ventre despojos antigos
Mas nada os prende às vidas acabadas

São os mordomos do universo todo
Senhores à força mandadores sem lei
Enchem as tulhas bebem vinho novo
Dançam a ronda no pinhal do rei

Eles comem tudo eles comem tudo
Eles comem tudo e não deixam nada [bis]

No chão do medo tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos na noite abafada
Jazem nos fossos vítimas dum credo
E não se esgota o sangue da manada

Se alguém se engana com seu ar sisudo
E lhes franqueia as portas à chegada
Eles comem tudo eles comem tudo
Eles comem tudo e não deixam nada [bis]

Eles comem tudo eles comem tudo
Eles comem tudo e não deixam nada [bis][bis]

Os Vampiros
José Afonso


Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada [Bis]
Quem tem uma mãe tem tudo
Quem não tem mãe não tem nada [Bis]

Quem não tem mãe não tem nada
Quem a perde é pobrezinho
Quem não tem mãe não tem nada
Quem a perde é pobrezinho [Bis]
Ó minha mãe minha mãe
Onde estás que estou sozinho
Estou sozinho no mar largo
Sem medo à noite cerrada [Bis]
Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada

Minha Mãe
José Afonso


Zeca Reinventado
Oiça o novo Fura Fura por alunos e professores de Artes do Espetáculo - Interpretação da nossa Escola Secundária.


Veio lá da terra
Um homem
Tentar a ventura
Põe a roupa
Na maleta
Lá vai de abalada
Não pensa em voltar
Faz como a formiga
Fura fura
Fura sem parar
Pela estrada fora
Era já
Meia-noite
Só cães a ladrar
A chuva na terra
O vento no mar
Um velho voltou
E disse-me adeus
Cantando e dançando
Debaixo do céu
"Que é pena, que é mágoa
Que uma ave de penas
Não possa voar"
Às vezes
Não tenho jeito
P'ra falar de amigos
Meu amigo
Passageiro
Dá-me o teu capote
Para me abrigar
Vai num barco à vela
Numa aduela
Vai fazer-se ao mar
Passaram-se os dias
Dias da
Vida dum cavalo
A galopar
E o homem a andar
E o homem a andar
Um velho voltou
E disse-me adeus
Cantando e dançando
Debaixo do céu
"Que é pena, que é mágoa
Que uma ave de penas
Não possa voar"


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José Afonso foi (é) um dos maiores vultos de Portugal (do século XX) e foi professor da nossa Escola Industrial e Comercial de Faro, em 1958/59 e no início dos anos 60 do século XX.


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Notas biográficas


José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos (ZECA AFONSO) nasceu em Aveiro, a 2 de Agosto de 1929, filho dum magistrado e duma professora primária. A infância reparte-se entre Aveiro, Angola, Moçambique, Belmonte e Coimbra, devido às sucessivas deslocações profissionais do pai.

Em Coimbra, estudante do Liceu D. João III, conhece o guitarrista António Portugal e começa a interessar-se pela música. Em fins da década de 40, já aluno de Ciências Histórico-Filosóficas da Faculdade de Letras de Coimbra, destaca-se, à semelhança do irmão, como cantor de fados. Conhece o mestre guitarrista Flávio Rodrigues e a cantadeira popular Cristina Matos.

Casa pela primeira vez em 1950, com Maria Amália, de quem tem dois filhos, José Manuel e Helena. As dificuldades económicas levam-no a trabalhar como revisor no «Diário de Coimbra». Em 1953 grava os primeiros discos (de 78 rpm), com «Fado das Águias» e outras canções, o que voltou a acontecer em 1956 (já em discos de 45 rpm). Em 1958 viaja com a Tuna Académica até Angola, numa viagem que repetirá, dois anos depois, com o Orfeon Académico. Em 1960 grava a «Balada de Outono» e, depois, de modo irregular vai gravando alguns discos de pequeno formato (EP), até 1964, ano em que, já casado com Zélia, parte para Moçambique. Os filhos de ambos, Joana e Pedro, nascerão nos anos seguintes.

Pelo caminho deixa o serviço militar cumprido em Mafra (entre 1953 e 1955), onde se distinguiu pela sua permanente distração e incapacidade para dar ordens e uma experiência de professor do ensino secundário iniciada em 1956 e que o levou a diversos liceus e colégios de Mangualde, Aljustrel, Lagos, Faro e Alcobaça.

É ainda como mestre-escola que regressa a África em 1964, experiência que se revelará fundamental na sua formação política. Na Beira, colabora com o Teatro Experimental e escreve a música para a peça «E Excepção e a Regra», de Brecht. Volta a Portugal em 1967, ano em que é pela primeira vez editado em «long playing» (33 rpm)  «Baladas e Canções», historicamente o seu primeiro álbum, que recolhe gravações anteriores à sua partida para Moçambique e editadas em vários EPs.

Expulso do ensino por razões políticas, dedica-se mais assiduamente à música e inicia um período de gravações regulares com «Cantares do Andarilho» (1968). No ano seguinte grava «Contos Velhos Rumos Novos» e, em 1970, publica «Traz outro Amigo Também» e visita Cuba. No ano seguinte edita «Cantigas do Maio», e tudo passa a ser como era na música portuguesa. Aliás, 71 é um ano de luxo para a música portuguesa: Sérgio Godinho grava «Os Sobreviventes», Adriano Correia de Oliveira edita «Gente de Aqui e de Agora», José Mário Branco publica «Mudam-se os Tempos Mudam-se as Vontades», Luís Cília vê sair em França o terceiro álbum da série «A Poesia Portuguesa de Hoje e de Sempre». Ainda nesse ano recebe o terceiro prémio consecutivo da Casa da Imprensa pelo melhor disco.

Em 1972 canta pela primeira vez na Galiza e participa no Festival Internacional da Canção do Rio de Janeiro, onde apresenta o tema «A Morte Saiu à Rua», dedicado ao pintor José Dias Coelho, assassinado pela Pide. Edita «Eu Vou Ser Como a Toupeira».

Participa activamente no III Congresso da Oposição Democrática, em Aveiro, em Março de 1973 (onde estreia em público «O Que Faz Falta») e envolve-se na acção politica com grupos de vários sectores da Esquerda, desde o PCP à LUAR. Publica «Venham mais Cinco» (73).

Em 29 de Março de 1974 participa no Encontro da Canção, no Coliseu dos Recreios, onde a censura não lhe permite cantar mais do que duas canções: «Milho Verde» e «Grândola Vila Morena». Menos de um mês depois, a 25 de Abril, esta era a senha do Movimento das Forças Armadas para o início da que ficaria para a história com o nome único de Revolução dos Cravos.

Ainda em 1974 faz sair «Coro dos Tribunais», mas só voltará a publicar em 1976  «Com As Minhas Tamanquinhas». Nesses meses («essa coisa magnifica que foi o PREC»), percorre o país de ponta a ponta, num sem fim de «sessões», «acções de dinamização», «campanhas de alfabetização». Grava um disco em Itália de apoio à luta do jornal «República» e outro para a LUAR «Viva o Poder Popular» / «Foi Na Cidade do Sado», ganha o Prémio Internacional de Folklore da Academia Fonográfica alemã (1976). Apoia as candidaturas à Presidência da República de Otelo Saraiva de Carvalho (1976 e 1980) e Maria de Lurdes Pintasilgo (1985). Grava «Enquanto Há Força» (77), «Fura Fura» (79), «Baladas de Coimbra e Outras Canções» (81).

Em 1982 visita Moçambique e é recebido pelo Presidente Samora Machel com honras semelhantes às de um chefe de Estado. É-lhe diagnosticada uma doença incurável (esclerose lateral amiotrópica) que se caracteriza pela destruição lenta e progressiva do tecido muscular. Viaja pela Roménia, Inglaterra e Estados Unidos, em busca de uma solução.

Em 1983 realiza os últimos espectáculos, nos coliseus de Lisboa e Porto. Publica o disco «Ao Vivo no Coliseu» e um belíssimo LP de originais, «Como Se Fora Seu Filho». Um ano depois, recebe dos doze participantes no Concerto pela Paz e Não Intervenção na América Central, realizado em Manágua, uma das mais significativas homenagens: uma mensagem assinada, entre outros, por Pete Seeger, Chico Buarque, Carlos Mejía Godoy, Sílvio Rodriguez, Daniel Viglietti, Isabel Parra e Amparo Ochoa. Nesse mesmo ano foi editado o livro "As Voltas de um Andarilho", de Viriato Teles, uma extensa reportagem sobre a vida e a obra de Zeca. Em 1984, José António Salvador publica "Livra-te do Medo", um outro trabalho biográfico sobre o poeta-cantor - reeditado em 1994 em nova versão, mais ilustrada, com o título "José Afonso - O Rosto da Utopia".

Em 1985 publica o derradeiro disco, «Galinhas do Mato», onde já só dá voz a dois dos temas. Os restantes têm interpretações de Janita Salomé, Helena Vieira, Luís Represas, Né Ladeiras e José Mário Branco. Morre, no hospital de Setúbal, na madrugada de 23 de Fevereiro de 1987.

Uma segunda edição (muito) aumentada de "As Voltas de um Andarilho" foi publicada em Novembro de 1999 pela Editora Ulmeiro. Este novo livro inclui um prefácio de Sérgio Godinho, intitulado "A que distância está o Zeca?", e uma crónica de Fernando Assis Pacheco, "Só me calham Dukes".

in Wikipédia


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