sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Franco, Carlos Augusto Lyster


LYRIOS BRANCOS

        À Exma. Sra. D. Maria Eugenia de Mello e Albuquerque

É tudo fumo vão; pó e cinza que o vento leva
de monte em monte e de vales em vales!
É pó e cinza a estrela a rir no firmamento!
é fumo o suave olor[1] que o lírio tem no cálix[2]!

 J. A. de Castro.

No luminoso País da Ventura, longe, muito longe da perversidade dos homens, num rincão[3], onde as flores têm a macieza dos arminhos[4] e as brisas são impregnadas dos mais suaves perfumes, existe um grande lago, cujo perímetro é debruado pelo verde musgo e em cujas cristalinas águas, onde pululam peixes cor de oiro, se espelham os mais formosos lírios brancos.
Tão lindos como efémeros, duram um só dia, um instante quase.
Começam sorrindo às alvoradas e morrem ao declinar do sol!
De manhã, na limpidez do ar, os seus graciosos hastis[5] animados pelo calor vivificante do sol, erguem-se majestosos, parecendo sustentar flores ideais feitas de prata e de cujas pétalas de brancura deslumbrante, irradiam reflexos de cetim
Que lindos são os lírios brancos!
Inutilmente, porém, o sol busca, ao despedir-se saudoso da terra, colori-los com as rúbidas[6] cores do poente.
Declina a tarde, e eles pendem, emurchecidos[7] e tristes, sobre as ondulantes águas do lago e terminam, na paz daquela hora crepuscular, a sua efémera existência florida.
Na madrugada seguinte, outros ressurgem, ainda mais belos, mais lindos... a deliciar a vista dos imortais que vivem no País da Ventura ...
Só as nossas esperanças, lindas... tão lindas como os lírios brancos e como eles efémeras[8], morrem em cada dia para não mais ressurgir!  


[1] Cheiro muito bom, aroma muito agradável.
[2] Cálice, invólucro da flor (,copo pequeno com pé).
[3] Recanto; lugar afastado, sítio longínquo.
[4] Animal de pequeno porte cuja pele é/era aproveitada para golas de casacos.
[5] Pés ou hastes das flores.
[6] Vermelhas, rubras.
[7] Murchos, mirrados.
[8] Que tem pouca duração.



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Para participar no concurso "Cont'Arte Audioleitura 2020" pode ler o excerto acima publicado ou qualquer outro do autor

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Carlos Augusto Lyster Franco  foi  um dos maiores vultos da cultura da cidade de Faro, lecionou  nas Escolas Pedro Nunes, Escola Normal Superior, Escola Tomás Cabreira e Escola do Magistério Primário, tendo sido igualmente diretor da Escola Tomás Cabreira e Pedro Nunes
                                           
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Como curiosidade apresentamos um recorte do Jornal O ALGARVE de 2 de outubro de 1932


Biografia

CARLOS AUGUSTO LYSTER FRANCO

           Natural de Lisboa, veio para Faro em 1901. Foi professor, comissário distrital de Polícia, director do Posto Meteorológico D. Francisco Gomes, jornalista, pintor, Presidente da Câmara Municipal de Faro em 1919 e Vereador da mesma autarquia em 1919-22. 
            É deveras impressionante a aptência e preparação profissional deste homem, que foi professor em várias escolas da cidade, mas em matérias diferentes, o que certamente lhe exigia uma preparação sólida mas diversificada. Foi comissário de Polícia onde  lhe seria exigido o conhecimento de leis, foi diretor do Posto Meteorológico onde lhe exigiriam conhecimentos de geografia física. Como jornalista deveria ser possuidor de bons conhecimentos de literatura, como pintor deveria ser possuidor de intuição e habilidade de mãos e teria  ainda conhecimento de gestão de empresas para estar preparado para o desempenho do cargo de Presidente e vereador da Câmara.
           Faleceu em 1959.


  

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